Guia Ilustrado da Privatização da Democracia no Brasil - Captura corporativa

Captura corporativa

/Política

Chamamos de captura política a influência assimétrica, ou desproporcional em relação a outros atores sociais, das empresas privadas ou entidades representativas do setor sobre os processos e instâncias de tomada de decisão dos poderes públicos, de forma a beneficiar seus próprios interesses, muitas vezes em detrimento do interesse público.

Na captura política, as decisões sobre leis (de competência do Legislativo), sobre a interpretação e aplicação da lei (Judiciário) e sobre o desenho e execução das políticas públicas (Executivo) são influenciadas para que seja favorecido o lucro de atores econômicos específicos.

O enfraquecimento ou a diluição de regulações que controlam a conduta de determinado setor econômico, o conhecimento antecipado de planos ou programas governamentais, a participação em conselhos ou comissões encarregadas de desenhar ou implementar políticas públicas, o financiamento de campanhas políticas, o lobby e a promoção de banca das parlamentares no Congresso, bem como a contratação de políticos e funcionários públicos com contatos no governo são alguns dos mecanismos utilizados por empresas para influenciar as decisões políticas.

Além dessa captura institucional, as empresas também tentam influenciar decisões políticas por meio do que chamamos de captura “cultural” ou “ideológica”. Esse tipo de captura ocorre quando os atores econômicos, por meio dos meios de comunicação, da publicidade, da produção de conhecimento “científico” e de outros mecanismos, disseminam visões de mundo, valores ou conceitos determinando quais são as formas mais desejáveis de agir, consumir e pensar, ou difundindo a ideia de que essas são as únicas possíveis formas de ação, consumo ou pensamento. Pior ainda é a tentativa de diversos atores econômicos de incutir a ideia de que agir de acordo com seus interesses equivale a agir de acordo com interesse público.

/Econômica

As empresas privadas também se utilizam de seu poder econômico para se apropriar de uma fatia desproporcional da riqueza social ou dos bens comuns, em um processo que chamamos de captura econômica. A financeirização de praticamente todos os setores da economia, a manutenção de altas taxas de juros e a ameaça por grupos de investidores de retirar investimentos de determinado país caso certas condições econômicas não sejam cumpridas são exemplos das formas pelas quais as empresas se utilizam de seu poder econômico para ampliar ainda mais a concentração de riqueza em suas mãos.

/No âmbito internacional

As agendas dos “Itamaratys” são construídas em grande parte com base nos interesses dos poderes econômicos dominantes em cada país. A captura corporativa é, com alguns matizes, parte constitutiva da formulação da política externa das nações. Recentemente, foi constatado que para elaborar a proposta da UE na negociação do tratado com os Estados Unidos, foram realizadas 528 reuniões, das quais 88% foram com lobistas empresariais e só 9% com grupos de interesse público1. O processo de tomada de decisões no sistema das Nações Unidas tende a estar mais afastado da vista do público, o que facilita a captura corporativa. Há também a ausência de uma institucionalização da participação que defina regras para criar condições de concorrência equitativa entre sociedade civil e empresariado nos processos políticos globais.

Nesse contexto, como observa Harris Gleckman, após a crise econômica global de 2008, até mesmo os atores econômicos perceberam essa oportunidade e o problema da falta de uma governança global mais sólida. Por isso, o Fórum Econômico Mundial, por exemplo, levou adiante um amplo processo de consulta e produziu um informe chamado “Iniciativa de Redesenho Global” (Global Redesign Initiative), que se transformou no “manual mais abrangente para um sistema de governança global pós-Estado-nação”. Diferentemente do atual sistema, que inclui a consulta a múltiplos atores [multi-stakeholder], o relatório propõe uma “governança multi-setorial” como forma parcial de substituição das decisões intergovernamentais. Essa forma de lidar com a governança já tem sido promovida também em vários níveis dos órgãos da ONU, os quais têm recomendado “institucionalizar a parceira público-privada no nível global”.

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